Por que renovar as Concessões de Distribuição? 

As distribuidoras de energia elétrica possuem contratos de concessão com o Governo Federal pelo prazo de 30 anos. Vinte desses contratos, firmados no fim da década de 1990, estão próximos de seus términos e precisam ser renovados ou substituídos por contratos novos, afetando cerca de 57 milhões de consumidores em todo o Brasil. O primeiro contrato a vencer é o da EDP Espírito Santo, com vigência até 2025, seguida da Light e da Enel RJ, cujos contratos terminam em 2026. A pergunta então que deve ser respondida é: Faz sentido renovar esses contratos ou deveriam ser relicitados?

Qual a avaliação das concessões até aqui?

A primeira questão que precisa ser colocada é: Qual a avaliação dessas concessões até aqui?
Nessas quase três décadas, o setor certamente evoluiu muito, com a universalização do serviço praticamente concluída e com ganhos significativos na qualidade de serviço entregue ao consumidor. 
Mas isso só foi possível devido à capacidade de investimentos dos operadores que se mantiveram até aqui, sendo que muitas trocas de controle ocorreram nesse período, o que conduziu a uma consolidação no setor.
A regulação também teve um papel importante, oferecendo um ambiente mais estável e seguro para que os investimentos pudessem ser feitos.
É verdade que existem problemas pontuais, mas em sua grande maioria, as concessões são sólidas, de forma que é possível afirmar com toda certeza que a maioria das concessões, nesse período, tiveram uma evolução bastante positiva.

Qual a avaliação das concessões até aqui?

Um dos argumentos que se pode colocar em pauta é se haveria ganhos no processo com novas licitações…
A primeira questão é que tipo de licitação seria adotada…um modelo que extraísse renda para o Governo, a exemplo dos bônus de outorga das concessões de geração cotista ou um modelo que transferisse redução tarifária para o consumidor? 
O primeiro modelo presumiria que há um excedente econômico na concessão que poderia ser capturado em um processo de licitação. Porém, em um setor que é o mais regulado de todos, essa hipótese significaria que há uma falha grave na regulação, o que não acredito existir. Outra possibilidade, no entanto, seria incluir na tarifa o valor da outorga, como foi feito no caso das geradoras cotistas, o que seria indesejável, pois traria aumento tarifário.
Já o segundo modelo não é factível em um regime com revisões periódicas, o que poderia ter efeito apenas em um breve período. Vale lembrar que diferentemente do segmento de geração ou mesmo transmissão, em que se licita um ativo e mantém uma receita fixa até o fim da concessão, a dinâmica da distribuição prevê investimentos contínuos e revisões tarifárias periódicas.
Há diversas outras questões ainda a serem equacionadas se esse fosse o caminho adotado, como valores de indenização dos ativos e suas repercussões, além dos investimentos a serem feitos nesse final da concessão que ficariam bastante prejudicados.
Portanto, licitar esse tipo de concessão seria um processo extremamente oneroso e com potencial de ganho praticamente zero.

Mas faz sentido a renovação ser onerosa?

A proposta inicial colocada pelo Governo prevê a renovação das concessões, mas com contrapartidas sociais, para as quais os recursos sairiam da própria tarifa.
Entendo que se a avaliação é de que as concessões devem ser renovadas, não há qualquer necessidade dessas contrapartidas, especialmente porque vai se traduzir em aumento tarifário, um total contrassenso em um momento que se busca desoneração tarifária.
Essa primeira fase desse novo setor que se iniciou nos anos 90 esteve focada em expandir o serviço, tal como aconteceu em outros setores como de telecomunicações, por exemplo.
A oportunidade que se tem no horizonte é a de se buscar mais qualidade no fornecimento, a preços módicos, ou seja, justos e ao menor custo possível.
É evidente que a melhoria de qualidade requer investimentos, que por sua vez serão remunerados e se refletirão em mais tarifa ao consumidor.
Vale ressaltar que a lógica da regulação até aqui é focada em investimentos, pois são deles que decorrem a remuneração da distribuidora. Essa lógica fez com que ao longo do tempo houvesse ganhos de eficiência nos custos operacionais e investimentos na expansão das redes.
No entanto, seria desejável rever o modelo regulatório de forma a premiar mais a qualidade para que os ganhos estivessem mais vinculados ao serviço entregue e não somente aos investimentos em si, permitindo as distribuidoras tenham estratégias para alcançar esse objetivo, sem necessariamente conduzir a elevações tarifárias. 

O caso Enel SP

Recentemente, ocorreu o apagão na cidade de São Paulo, decorrente de fortes chuvas que aliadas a outras questões como a dificuldade de se fazer a adequada poda das árvores, resultou em muitas áreas com corte no fornecimento de energia.
Esse episódio levantou algumas discussões oportunistas sobre a renovação de concessões… 
Primeiramente, é importante ressaltar que o sistema de distribuição não é projetado para estar 100% disponível, embora esteja muito próximo disso, em média. Caso assim fosse projetado, a tarifa resultante seria impagável. Portanto, eventos extremos terão consequências. Pode-se questionar, eventualmente, o tempo de restabelecimento em alguns locais, mas isso não deve em nenhuma hipótese contaminar uma discussão que vai muito além de uma situação pontual.

Em resumo...

Nos próximos anos teremos o final de importantes contratos de distribuição, que entendo ser a renovação das concessões o melhor caminho a ser seguido. Também não se deve criar contrapartidas que no final possam onerar as tarifas do consumidor, sendo mais oportuno focar na qualidade do serviço com o menor investimento possível para reduzir a pressão tarifária. Para isso, aprimoramentos regulatórios certamente serão necessários, mas não precisaremos “reinventar a roda”. O caminho já é conhecido, basta ousarmos um pouco, tendo a consciência que o setor só é sustentável se for justo para todos! 

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