Considerando todos esses aspectos, a abertura do mercado de energia tem se dado de diferentes maneiras ao redor do mundo, variando em termos de abordagens e métodos, dependendo das condições econômicas, dos recursos naturais disponíveis e dos objetivos políticos de cada país ou região.
Uma questão importante a ser monitorada é a eventual criação de novos encargos setoriais para subsidiar iniciativas diversas, tais como os subsídios que estão sendo desenhado para o hidrogênio. É necessário que os subsídios sejam reduzidos, não aumentados, pois a conta de luz não suporta mais acréscimos caracterizados como transferências de renda sem transparência.
Além disso, promover a educação e a conscientização sobre o uso responsável e eficiente da energia, incentivando práticas de consumo sustentáveis. Esse processo não só impulsiona o desenvolvimento social e econômico, mas também contribui significativamente para a sustentabilidade ambiental, abrindo caminho para uma infinidade de avanços e melhorias no setor.
A possibilidade de todos os consumidores escolherem seus fornecedores de energia deve ser acelerada, sem a criação de encargos adicionais e rateios de sobrecustos para os demais consumidores.
Uma das ações concretas mais prioritárias neste momento é a publicação de um calendário para que todos os consumidores possam ser livres para escolher os seus fornecedores de energia. Essa medida, além de crucial, deve ser divulgada por campanhas informativas extensivas, de forma a permitir que a população compreenda o impacto e a importância da liberalização do mercado de energia.
É vital que tais campanhas também eduquem sobre o uso eficiente de energia e destaquem o papel individual dos consumidores na promoção da transição energética. Isso envolve desde a adoção de melhores hábitos de consumo, até a preferência por opções de mobilidade urbana sustentáveis. Essas ações são essenciais não só para a redução de custos, mas também como parte de um esforço mais amplo para a descarbonização da economia.
Um dos entraves alegados à liberação do mercado seriam os potenciais custos devido à sobrecontratação das distribuidoras. É importante que essa possibilidade seja efetivamente aferida, para que possa ser realmente caracterizada como um problema. Na hipótese de esse ser um entrave, antes de qualquer sobra de energia ser caracterizada como um sobrecusto a ser rateado, os contratos regulados existentes devem passar por uma análise detalhada considerando:
1. Avaliação criteriosa dos Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEARs) celebrados na modalidade por disponibilidade, comparando a disponibilidade contratada nos Leilões com a disponibilidade verificada. Caso os valores verificados sejam inferiores aos contratados, os volumes de energia dos CCEARs devem ser reduzidos, ou os CCEARs devem ser rescindidos, de acordo com o previsto nos próprios contratos;
2. Avaliação criteriosa do volume de energia alocada com o volume de energia contratada das usinas cotistas ou mesmo da UHE de Itaipu. Se a energia efetivamente entregue pelo contrato for inferior à contratada, os contratos devem ser ajustados, para refletir a efetiva entrega de energia;
3. Avaliação detalhada de todos os contratos do Ambiente Regulado que vencem nos próximos anos, considerando as reduções nos volumes de cotas, nos contratos bilaterais, nas usinas termoelétricas com CCEARs que estão sendo finalizados, e nas usinas termoelétricas oriundas do Programa Prioritário de Termoelétricas (PPT);
4. Aprimoramento dos mecanismos de gestão das carteiras das distribuidoras e avaliação do máximo esforço na redução da contratação.
Finalmente, deve haver consistência entre os contratos de energia e o próprio mecanismo de formação de preços. Se uma usina possui um CCEAR vencendo em 2025, e o empreendedor da usina pretende descomissioná-la a partir de 2026, essa usina deve ser retirada dos modelos de formação de preços a partir de 2026.
Adicionalmente, antes de qualquer sobra de energia das distribuidoras ser considerada um sobrecusto, devem ser priorizados mecanismos de mercado para valorização dessas sobras. Por exemplo, ao invés de liquidar mensalmente as sobras contratuais a PLD, esses mecanismos devem priorizar a venda da energia a comercializadoras, geradoras ou a consumidores livres, por períodos mais longos, com preços de venda superiores ao PLD.
É essencial para que esse processo da expansão da liberalização cumpra os requisitos esperados, que seja implantado o “Open Energy”, mecanismo similar ao “Open Banking”, onde os consumidores, donos de seus próprios dados, possam ter sua disposição meios ágeis para compartilhá los quando e como desejar, para que haja uma competição saudável e com os melhores resultados.
O Brasil apresenta sobras energéticas relevantes, tanto no que se refere à capacidade de atendimento com segurança (sobra de garantia física), quanto ao que se refere à produção efetiva de energia além das necessidades do mercado (vertimentos turbináveis nas usinas hidroelétricas, curtailment nas usinas eólicas e solares).
Neste contexto, a integração entre mercados deve ser incentivada e priorizada, de modo a aproveitar as sobras de energia brasileiras para serem alocadas, de forma competitiva, em mercados como o Uruguaio, o Paraguaio e o Argentino, com os quais já há interconexão física.
Ademais, integrações físicas devem ser fomentadas com outras geografias, incluindo Colômbia, Bolívia, Chile e demais países vizinhos que caracterizam o chamado “Arco Norte”.
O ponto de partida para essas integrações deve ocorrer por meio de acordos internacionais que tragam segurança jurídica para as negociações e que possibilitem investimentos em geração e em interconexão na região.
O mercado de carbono representa uma estratégia inovadora, com objetivos tanto comerciais quanto ambientais, criado para estimular o cumprimento das metas de redução de emissões de gases de efeito estufa estipuladas pelo Protocolo de Quioto e pelos acordos subsequentes. Esses mecanismos oferecem incentivos econômicos para práticas sustentáveis, visando à mitigação das mudanças climáticas.
O Setor Elétrico tem vivido de forma intensa os efeitos das mudanças climáticas, com impactos relevantes de secas (2021) e enchentes (2023), sendo interesse estratégico de seus stakeholders que o mercado de carbono se desenvolva para, simultaneamente, agregar resultados econômicos e mitigar os riscos associados ao clima.
Neste contexto, o Projeto de Lei 528/21, que tramita na Câmara dos Deputados, propõe criar dois sistemas: o Sistema Nacional de Registro de Compensações de Gases de Efeito Estufa (SNRC) e o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE).
Os dois sistemas abrangeriam os mercados regulado e voluntário de créditos de carbono, e seriam independentes e complementares. Ao abarcar ambos e estabelecer uma governança, o escopo do projeto torna-se amplo, com mecanismos de controle e transparência, objetivando garantir segurança e confiabilidade aos créditos registrados e comercializados.
É importante que o Setor Elétrico Brasileiro tenha suas baixas emissões reconhecidas nos mecanismos a serem estabelecidos. Assim, os períodos de compromisso e os limites máximos de emissões devem ser estabelecidos de forma proporcional à participação do setor no volume de emissões do país.
Somente a título de exemplo, em 2018, o Brasil ocupava a terceira posição em número de projetos, com 342 atividades registradas (4,4% de projeto de MDL no mundo), sendo que em primeiro lugar se encontrava a China, com 3.763 (48,4%), e em segundo a Índia, com 1.642 projetos (21,1%) (IPEA, 2018).
Logo vê-se que o Brasil, principalmente no que se refere ao SEB, tem grande potencial no papel de “vendedor” ou “ofertante” de créditos de carbono, podendo se beneficiar de mecanismos intersetoriais abrangentes e, principalmente, de mecanismos internacionais.
Abre-se também espaço para uma integração entre os diferentes benefícios ambientais, iniciando-se pela geração de energia limpa, e podendo estender-se à recuperação das matas marginais aos grandes rios.
O Setor Elétrico Brasileiro tem muito a se desenvolver com a eliminação de reservas de mercado e com o uso de incentivos econômicos que promovam eficiência e ganhos reais de produtividade.
Assim, a abertura de mercado deve ser entendida de forma ampla, dando liberdade aos consumidores, ampliando o acesso aos mercados de energia da América Latina, e desenvolvendo novos mercados, como o de carbono e o de hidrogênio.
Uma das ações concretas mais prioritárias neste momento é a publicação de um calendário para que todos os consumidores possam ser livres para escolher os seus fornecedores de energia. Essa medida, além de crucial, deve ser divulgada por campanhas informativas extensivas, de forma a permitir que a população compreenda o impacto e a importância da liberalização do mercado de energia.
Atenção especial deve ser dada evitar que novos subsídios sejam criados, caracterizando novas transferências de renda sem transparência, e aumentado o valor da conta de luz da população.